Manual Aberto TIC e LibreOffice – O Projecto

19 Setembro 2011 Por Adriano Afonso

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A Internet hoje traz-nos a possibilidade de poder partilhar informação como nunca antes foi possível com outros meios. O crescimento das redes sociais e de plataformas como o Youtube e Flickr são exemplos disso.

Mas a abertura e partilha de informações, conteúdos, materiais e sobretudo de espírito chega-nos nos finais do século passado pelas palavras de Richard Stallman com um movimento que tem ganho cada vez adeptos. Os resultados deste movimento estão bem presentes nas ferramentas que inocentemente utilizamos todos os dias, os servidores da Internet, no software, nos telemóveis, etc., que assentam em tecnologias de software livre.

A importação destes conceitos de contributo para um bem comum, partilha de conteúdos, a possibilidade de criar de um projecto que pudesse ser acedido por todos independentemente do seu estatuto social, raça ou ideal, levou-nos à criação deste manual.

A génese deste projecto provém de uma necessidade transversal a muitos formadores de TIC que não raras vezes são obrigados a criar os seus próprios manuais para os seus módulos. Muitos deles não dispõem do tempo livre desejado para esse fim. Criar um manual de raiz implica um custo elevado de tempo, tempo que num plano pessoal entendemos que deveria ser dedicado à vida particular e familiar.

A necessidade de criar um manual que respondesse às necessidades de um curso específico de TIC, direccionado para um grupo especial, levou à criação de um projecto de formação que usou como ferramenta de escritório o OpenOffice.org. No decorrer da construção do manual sentiu-se a necessidade (comum a muitos formadores) de procurar recursos pela Internet. Para OpenOffice.org existiam alguns recursos (mesmo que em Português do Brasil), mas para TIC, eram escassos, difusos e alguns com alguma falta de qualidade.

A primeira versão do manual então criado incluía uma primeira parte que abordava a temática do software livre, uma segunda que focava os conceitos iniciais de TIC e por fim uma terceira que orientava o formando/estudante na utilização da ferramenta OpenOffice.org.

A associação para a qual foi desenvolvido este projecto dispunha de poucos recursos financeiros (para licenças). Curiosamente partilhava também da mesma filosofia do software livre, e assim tornou-se fácil a sua implementação e a disponibilização do manual numa licença creative commons.

A utilização deste tipo de licença e a difusão por alguns meios de comunicação chamou a atenção de amigos e colegas de profissão. Quando houve a necessidade de desenvolver uma segunda versão do manual, foi posta em prática a liberdade número 3 aplicada à construção de um manual. Foram contactados diversos profissionais da área e assim, com uma série de colaborações, nasceu a 2ª edição do primeiro Manual Livre de TIC e OpenOffice.org, um livro electrónico (e-book) com ISBN que obteve o apoio da OpenOffice.org Portugal.

Tal como todos os softwares e projectos similares, a evolução do projecto não tardou a ser posta em prática. Mas enquanto marinava a sequência do projecto, a Oracle comprou a Sun Microsystems, o OpenOffice.org tornou-se uma bola de ping-pong (passada agora para as mãos do projecto Apache), e a The Document Foundation decidiu criar o LibreOffice que neste momento tem o apoio das maiores e mais importantes entidades do software livre.

Exactamente neste meio-termo entra a discussão do projecto da The Document Foundation e a Oracle, tornou-se mais profunda em Portugal a discussão entre a utilização de software livre e de software proprietário, quer pelo estado (o que inclui escolas, universidades e centros de formação), quer pelas empresas.

Este tem em sido um jogo de monopólio disputado entre vários peões, mas o que tem acontecido é que apenas um dos jogadores tem arrecadado o dinheiro. Portugal e os Portugueses, não são, sem dúvida, esse jogador. Hoje estamos numa situação (económica) em que não nos podemos dar ao luxo de jogar “jogos de azar”. Temos de mudar, e depressa, começando pela nossa mentalidade e pelas nossas opções tal como está a fazer grande parte da Europa, incluindo a Grécia.

Muitos de nós, e infelizmente formadores e professores, exactamente aqueles que são responsáveis pela educação dos vossos filhos, não sabem, ou não se preocupam em conhecer outras soluções. Colocando a questão de outra forma, talvez consigamos chegar ao cerne da questão. Será que algum de nós tem a ideia de quanto o nosso governo gastou em licenças de software (basta que multiplique cada computador de uma organização por mais ou menos 300€/400€) nas nossas escolas? E sabe de onde veio todo este dinheiro? Toda esta verba poderia ser investida em empresas Portuguesas, ou em Formadores e Professores Portugueses, ao invés de ser desperdiçada em empresas americanas.

A discussão ainda se torna mais pertinente com a evolução dos softwares e da consciencialização das empresas. Hoje questiona-se até que ponto a utilização de ferramentas proprietárias permitem uma liberdade tecnológica aos seus utilizadores (isto é, a liberdade de poder permutar de software sem prejuízo da sua integridade), e a interoperabilidade dos seus sistemas informáticos com os dos seus parceiros profissionais ou pessoais.

ODFDeste a adopção por parte da União Europeia do Open Document Format (ODF), que se veio a tornar o ISO/IEC 26300 para a definição de documentos, as entidades e os governos estão “obrigados” a disponibilizar a sua documentação em formatos livres e abertos. Portugal já adoptou a Lei das Normas Abertas (Decreto Lei 36/2011) o que também inclui estes formatos no Regulamento Nacional de Interoperabilidade Digital (RNID). Na prática isto permite que ninguém tenha que pagar por software para produzir os seus documentos, e ao mesmo tempo, que todos o possam consultar e partilhar, num ambiente de interoperabilidade.

E porque os nossos Professores e Formadores continuam com falta de recursos em ferramentas de escritório livres (para sua própria aprendizagem), porque não existe nenhum recurso actualmente de LibreOffice em Português de Portugal, porque o Ministério da Educação continua a gastar milhões (que não temos) em licenças Microsoft, porque é necessário um manual TIC com qualidade e que se possa partilhar, é importante continuar o projecto, melhorá-lo e partilhá-lo com toda a comunidade lectiva e formativa.

Desta forma convidou-se toda comunidade formativa e docente a envolver-se neste projecto que foi apresentado por Adriano Afonso (mentor do projecto) na primeira LibreOffice Conference em Paris, no dia 14 de Outubro de 2011 com o título: “Portuguese IT and LibreOffice Open Manual“.

QNQPara a presente edição pretende-se atingir três principais objectivos que se fundam na procura de: um equilíbrio entre a documentação existente noutras línguas criada pela comunidade LibreOffice e a documentação para a língua portuguesa, de forma a responder o mais adequadamente possível ao Quadro Nacional de Qualificações, criando uma poderosa alternativa à utilização de softwares e documentos proprietários.

O resultado de todo deste trabalho está aqui presente. Mais de uma dezena de profissionais da área da formação e da educação contribuíram directa ou indirectamente com conteúdos, com o seu trabalho ou com o seu tempo para um projecto em que acreditaram ser possível, ajudando não só os seus colegas de profissão como todos os cidadão do país, mudar de direcção e paradigma no que ao software e aos documentos livres diz respeito. Em suma, fazer acontecer com as tecnologias (e os nossos documentos) aquilo que os nossos pais e avós fizeram no dia 25 de Abril de 1975: torná-los livres.

Presentemente este projecto conta com o apoio do projecto Caixa Mágica, da Novell Portugal, da Associação Ensino Livre, da Associação Nacional de Software Livre, da Ângulo Sólido, do OpenLab-ESEV Laboratório de Software Livre da Escola Superior de Educação de Viseu, do Instituto Superior de Ciências Educativas e também do Portal Forma-te e em especial do ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa.

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